Por que eu fico?

Cada sexta nesse horário morro de ansiedade para chegar em minha casa em Tapuio. Não aguento o barulho da cidade, a agressividade, a imensa falta de consideração, o jogo constante de domínio que faz parte de quase cada interação com os outros. Aos três anos de idade comecei a fugir para a mata. Apenas tolero, e muito mal, ficar na cidade.

(Uns me chamam de ogro por isso. Tudo bem, mas não sou ogro. Sou eremita. Sou mais bonito.)
Ao mesmo tempo, cada sexta nesse horário, fico consumido por uma apreensão terrível. O que vou encontrar quando eu chegar? Será que vou conseguir subir até minha casa sem cair e quebrar mais uma peça na moto? (Apesar das promessas, a prefeitura de Iconha não conserta a estrada. Faz 7 anos e três meses desde a última vez que a prefeitura de Iconha consertou a estrada de Tapuio. Promete fazer. O que é que vocês dizem aqui? Pimenta no olho do outro….)
Ao chegar em casa, o que vou encontrar? Às vezes encontro tudo em perfeita condição (levando em consideração a péssima condição da minha casa).
Às vezes encontro horrores. Umas coisas que já encontrei lá: Fezes esfregadas nos troncos das árvores, nas paredes, e jogadas em cima da casa. Cano de água cortado em 2, 3, 10 partes. Janelas e portas quebradas. Meus pertences jogados e espalhados pela casa. Ratos mortos jogados na sala. Ameaças de morte escritas na areia atrás da casa.
Até fio de energia cortaram. (Sei quem foi. Quando falei com eles, me acusaram de ser um ingrato, pois me ajudaram, segundo uns deles. E não estou usando a outra casa mesmo, então qual o meu problema?)
Às vezes chego em casa e encontro pessoas andando em volta, pegando fruta, pegando outras coisas.
Já aprendi que muitas pessoas não têm vergonha.
Mesmo quando a casa está bem, sem invasões, sempre tem o problema dos caçadores dando tiros de noite e os trilheiros destruindo tanto a tranquilidade quanto a estrada de dia. Consciência social não é uma característica marcante do povo dessa região.
Então por que fico? Tantos já me mandaram embora. Já nada me prende aqui. E daqui a pouco, se tudo continuar como vai, nem árvore mais vai ter em Tapuio.
A resposta é o seguinte: Enquanto muitos aqui debochavam de mim, aproveitavam de mim, mentiam a meu respeito, me chamavam de arrogante e fedorento (e coisas piores ainda) até o ponto de eu querer me jogar da montanha, Tapuio me consolava, me acolhia, me abrigava. Enquanto as pessoas da região me falava que brasileiro vai a meu país para limpar a bosta dos Americanos então agora é a minha vez de sofrer, os bichos de Tapuio, iraras e quatis e beija-flores e cachorros do mato e mesmo até tamanduás, andavam comigo nas estradas de Tapuio.
Tapuio, tanto os bichos quanto a mata, me abrigou quando eu não tinha mais aonde ir nem como. Salvou a minha vida.
Agora preciso fazer igual para Tapuio.

#SalveTapuio

Buzzard Rock. One of the symbols of Tapuio

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